A noite é uma poesia

por Michelle Sill

Não parar da cidade

Não sóbria comigo mesma
Vejo o não parar da cidade.
Não sou daqui, mas permito-me
Falar um pouco,
Não vai causar estouro.


As carroagens aqui não param
Os semáforos em preto e branco
Há luzes em toda direção,
Luzes me causam espanto.


Dona de nova maravilha,
Limpa Rio tuas verilhas que vem a feder na Lapa.
E sem sentir dor, assistes a tarde e inspira-te
Com o imaginado por do sol do Arpoador.


Mas não perdestes assim sua beleza ociosa
És história, és cultura. 
Cidade M-A-R-A-V-I-L-H-O-S-A.
Dona de muito fervor...






Meu tormento

Ouvindo o relógio 
Cumprir o tempo
Me vi sozinha a tua espera.
Agora sei que te aguardo,
Contando as horas feito uma pedra.

Este atraso, indesejável
Virou momento de abstinência.
Vem depressa meu tormento!
Abraça-me com tuas pernas
E me tira desse silêncio.

Sopra-me um beijo;
Faz-me exagero;
Sossega em meu peito;
Conta-me outro segredo;
Me pega sem medo.


Nós

Seus olhos, já ressacados a me olhar
Dizem-me bom dia, 
Sem se entregar.
E dentro de ti penso eu estar hoje
Passando numa rua qualquer.
Hoje sou eu a passar contigo,
Num piscar de silêncio
Que as vezes fala mais alto, perigo!


Comparsas, cúmplices 
Agora parceiros e amantes.
Hoje não estamos mais a sós
Numa solidão inexistente.
Enlaçados um no outro
Façamos planos e caibamos neles conscientes.
Sejamos  enfim nós
A amarrar nosso amor:
Nó trilene
Nó olho
Nó terminal
Nó cego talvez.


Então, sejamos mais que o ato.
Amo-te desde ontem e sempre
Onde assino no contrato?







Calor calor

Esquentando no não frescor
Das palavras que surgem no vento
Foram ditas e não escritas,
Tomaram-me em ti de repente.


Louca no calor do balneário
De afetos quentes e já cumpridos.
Louca de toques frescos e oferecidos
Já loucalorcalorcalorcalor... Que indecente!


Delícia de calor já fundido
Toca em meu corpo e derrete
Lambe-me com a língua do vento
E meu corpo teu calor exerce.